Com o objetivo de aprofundar o debate sobre os impactos econômicos da crise climática no Brasil e articular soluções antes da realização da COP30, o Instituto Clima e Sociedade (iCS) e o E-mundi promoveram, no Rio de Janeiro, um painel sobre clima e economia. O encontro também marcou o lançamento do HUB de Economia e Clima, uma iniciativa voltada à integração entre ciência, mercado, sociedade civil e poder público.
O HUB foi criado com a missão de estimular pesquisas econômicas aplicadas, promover inovação, atrair investimentos e gerar benefícios sociais e ambientais duradouros. A proposta é reunir centros de pesquisa, investidores, empresas e formuladores de políticas públicas em torno de uma agenda climática eficiente, com foco na prevenção e não apenas na resposta a desastres.
Catástrofes expõem urgência de planejamento
A tragédia climática no Rio Grande do Sul, em 2024, colocou em evidência a vulnerabilidade econômica brasileira diante de eventos extremos: mais de 85% do orçamento destinado à gestão climática foi consumido pela resposta à emergência. O cenário reforçou a necessidade de estratégias que atuem antes da crise e evitem perdas futuras, um dos principais objetivos do novo HUB.
O projeto também pretende investigar como a crise climática afeta a inflação dos alimentos, a produtividade agrícola e a segurança alimentar, e de que maneira esses fatores devem ser incorporados às decisões macroeconômicas no país.
Diálogo com o Sul Global e foco na aplicação
Segundo Walter De Simone, diretor técnico do HUB, a proposta é construir uma rede de colaboração com economistas de países como África do Sul, Índia e Indonésia, e busca soluções aplicadas à realidade do Sul Global. O objetivo é desenvolver alternativas viáveis e adaptadas aos desafios enfrentados por economias emergentes.
Para Annelise Vendramini, professora da FGV e especialista em finanças sustentáveis, o Brasil possui uma produção científica de qualidade, mas ainda carece de financiamento e visibilidade. Ela afirma que o HUB irá priorizar pesquisas aplicadas, com foco em problemas concretos e de alta urgência social e ambiental.
Um estudo internacional (Overland & Sovacool, 2020) mostrou que, entre 1990 e 2018, o financiamento global à pesquisa climática destinou 770% mais recursos às ciências naturais do que às ciências sociais e econômicas, uma distorção que o HUB pretende ajudar a corrigir. No Brasil, estudos sobre misallocation (má alocação de recursos produtivos entre setores) são exemplos de como a pesquisa econômica pode revelar gargalos que travam a capacidade de investimento em mitigação e adaptação climática.
Brasil deve precificar emissões a partir de 2027
Apesar de ser o sexto maior emissor de gases de efeito estufa do planeta, o Brasil ainda não aplica custos diretos sobre as emissões. A previsão é que isso mude com a entrada em vigor do Imposto Seletivo e do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), previstos para 2027.
Esses instrumentos, já utilizados por países que representam cerca de 30% das emissões globais, são fundamentais para corrigir distorções históricas. Hoje, os setores mais poluentes não arcam com os custos ambientais que geram. A expectativa é que a precificação estimule inovação, direcione investimentos e impulsione a transição energética brasileira.
Escassez de chuvas ameaça produtividade e PIB
Estudo da FGV IBRE mostra que, entre 2012 e 2021, a frequência e intensidade das secas comprometeram a agropecuária brasileira, com impactos diretos em setores como alimentos, energia e transportes. A escassez hídrica, segundo os especialistas, precisa ser tratada como risco macroeconômico, e não apenas setorial.
Bráulio Borges, pesquisador do FGV IBRE e conselheiro do HUB, destaca que conter o desmatamento e restaurar áreas degradadas são medidas essenciais para reequilibrar o ciclo hidrológico no país. “Restaurar florestas, além de reduzir emissões de gases de efeito estufa, é uma forma de proteger os setores mais estratégicos da economia nacional”, afirma.
Um estudo da USP estimou que a produtividade agrícola, que cresceu 2% ao ano entre 1996 e 2017, poderia ter avançado 3% ao ano sem os impactos negativos do clima, um dado que mostra o custo invisível da crise climática para o desenvolvimento do país.
Financiamento climático ainda enfrenta obstáculos
Outro obstáculo apontado no painel é o baixo volume de investimentos privados em projetos de transição verde no Brasil. Isso se deve, em grande parte, ao alto risco percebido pelos investidores e à ausência de garantias adequadas.
Para vencer essa barreira, especialistas defendem a ampliação de instrumentos financeiros que compartilhem riscos entre os setores público e privado, como forma de reduzir o custo de capital e escalar soluções de baixo carbono. Essa será uma das frentes estratégicas do HUB, que pretende consolidar-se como referência nacional e internacional na integração entre economia e clima.
Texto: Júlia Marques com informações da assessoria de imprensa.