No universo das promessas climáticas, o Brasil lançou uma nova meta que, apesar de ambiciosa para alguns, desperta críticas por sua moderação para outros. Enquanto o mundo observa com atenção os preparativos para a COP30, o país estabeleceu o compromisso de diminuir entre 59% e 67% suas emissões líquidas de gases de efeito estufa até 2035, tomando como base os níveis de 2005. Mas será que esse alvo é realmente adequado para os desafios do planeta?
Apresentada durante a COP29 em Baku, no Azerbaijão, a Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) brasileira estipula que as emissões devem ficar entre 850 milhões e 1,05 bilhão de toneladas de CO2 equivalente até 2035. Cada nação define sua própria meta, alinhada ao Acordo de Paris, que tem como meta limitar o aumento da temperatura global a 1,5 ºC acima dos níveis pré-industriais. Contudo, especialistas ouvidos pela reportagem alertam que tanto o Brasil quanto o mundo poderiam estabelecer compromissos mais vigorosos para evitar um agravamento das mudanças climáticas.
O plano brasileiro contempla medidas em vários setores, como o investimento em energias renováveis, biocombustíveis, agricultura sustentável e biomassa. O destaque principal fica para a promessa de erradicar o desmatamento ilegal até 2030 e o desmatamento em geral até 2035, o que representa um avanço importante, porém insuficiente para alguns analistas.
“O Brasil poderia fazer muito mais”, afirma Claudio Angelo, coordenador de política internacional do Observatório do Clima. “Uma análise do Observatório do Clima mostrou que só com as tecnologias existentes hoje, com políticas que a gente já tem e tomando algumas decisões muito sérias em relação, por exemplo, a produção e consumo de petróleo, a gente poderia chegar em 2035 com um teto de emissões de 375 milhões de toneladas de CO2. O que seria compatível com a necessidade do mundo de limitar o aquecimento global a 1,5 °C.”
REDUÇÃO DO DESMATAMENTO
Alexandre Prado, líder de mudanças climáticas do WWF-Brasil, destaca que o maior problema da meta está na excessiva dependência da redução do desmatamento para conter as emissões, enquanto outras fontes poluentes, como a exploração de petróleo e gás, permanecem praticamente intactas. “[A meta] joga uma grande parte do esforço na eliminação do desmatamento, o que obviamente faz sentido, mas ela não faz uma alteração significativa na redução da produção e exploração de petróleo e gás”, pondera Prado. “Deixar esse desafio que é mais difícil para depois não faz sentido, porque a emergência climática é tão urgente. Nós estamos vendo o que está acontecendo no planeta.”
Ao comparar o compromisso brasileiro com os de outros países, Angelo ressalta que o Brasil está entre os que apresentam metas mais ambiciosas, mas alerta para o baixo nível geral dos compromissos globais. “A meta brasileira é uma das mais ambiciosas, mas isso não é grande coisa, porque os outros países não têm ambição quase nenhuma”, enfatiza. “A gente precisaria de um corte global de 43% das emissões em relação a 2019 até 2035, e isso não está sendo entregue nem pelo Brasil, nem pelos outros países”.
TRANSFORMAÇÃO DA MATRIZ ENERGÉTICA
O Apesar das críticas, Prado mantém uma visão otimista quanto à possibilidade de cumprimento das metas globais, reconhecendo a complexidade da transformação da matriz energética em nível mundial. “Obviamente tinha que ser melhor, mas mudar a matriz energética de 190 países não é um desafio fácil”, comenta. “Nós somos, talvez, a primeira geração que tem consciência do tamanho do desafio, mas também tem plenas ferramentas para enfrentar esse desafio.”
“O momento é da gente tentar sobreviver como espécie”, conclui Angelo. “E tentar garantir que as outras espécies que partilham o planeta com a gente sobrevivam também. Não tem uma opção, é fazer ou fazer.”