Cintia Magno De Baku, Azerbaijão – A segunda semana da 29ª Conferência do Clima da ONU, a COP29, segue a fase mais intensa de negociações entre os países, quando as partes concentram suas ações em resolver os pontos mais críticos da agenda climática. No que se refere especificamente às discussões sobre adaptação, a COP29 já conseguiu avançar no que se refere à definição de indicadores do Objetivo Global de Adaptação.
A especialista em mudanças climáticas do WWF-Brasil, Flavia Martinelli, explica que a agenda de adaptação começou a COP29 com quatro negociações e, agora, na reta final, resta apenas uma agenda, que é a meta global de adaptação. Essa última agenda deve ser finalizada no final da semana, mas ela lembra que a discussão será central para a próxima conferência do clima.
“Essa COP do Azerbaijão é o meio do caminho até chegar em Belém. Em Belém, a gente vai ter a finalização desse trabalho sobre os indicadores da Meta Global de Adaptação, que vão ser muito importantes, inclusive, para os Planos Nacionais de Adaptação. Então, vai sair uma lista de indicadores importantes para a gente monitorar como que a implementação de adaptação vai ocorrer nos países”.
Outro balanço positivo para o Brasil está no fato de o país ter considerado um tópico de adaptação na nova Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) apresentada na COP29. “A NDC brasileira inclui um tópico sobre adaptação, mas de uma forma muito geral porque o Plano Nacional de Adaptação ainda está em vias de elaboração. Provavelmente vai ser publicado no início do ano que vem, mas é uma boa sinalização que a adaptação foi incluída na NDC brasileira. É algo que nem todos os países fazem, então, é muito bom que o Brasil trouxe esse tópico. É uma sinalização de que o Brasil está olhando, também, para adaptação no seu país”.
PAINEL
O papel do Brasil no debate sobre as Metas Globais de Adaptação foi, inclusive, tema de um dos painéis realizados no estante do WWF, que dedicou a quarta-feira (20) à programação voltada para o Brasil. O painel reuniu a Pilar Bueno Rubial, diretora executiva do Argentina 1.5, organização que reúne pesquisadores e ativistas que atuam com a pauta de mitigação e adaptação climática; a Mariana Paoli, Líder de Advocacia Global da Christian Aid; e a Mariana Belmont, assessora de clima e racismo ambiental de Geledés – Instituto da Mulher Negra.
Sob mediação de Maheen Khan, do WWF-Holanda, as painelistas apresentaram um panorama acerca da agenda de adaptação no que se refere tanto aos aspectos da negociação, quanto do financiamento e dos impactos das medidas na vida das pessoas.
A assessora de clima e racismo ambiental de Geledés – Instituto da Mulher Negra, Mariana Belmont, lembrou que, quando se fala de adaptação, é preciso considerar as realidades e especificidades locais. “Dentro do processo participativo de construção de planos tanto nacionais, quanto estaduais e municipais, a gente precisa levar em consideração as experiências locais, tradicionais, não só da área rural, mas também da área urbana. A gente vê comunidades tentando sobreviver e criando alternativas, tecnologias próprias dentro dos seus territórios periféricos, negros e isso precisa virar experiência replicável dentro de políticas”, avalia. “É óbvio que cada território tem uma especificidade, cada território tem a sua conexão com o problema, mas eu acho que existem experiências muito exitosas que estão dando certo e que precisam de investimento, precisam ser replicadas como política pública para que outros territórios que não têm a mesma tecnologia consigam se utilizar disso na criação das suas políticas públicas”. (A repórter viajou a convite do Instituto Clima e Sociedade – ICS)
Conferência abre oportunidades para a iniciativa privada
Há 29 anos, representantes de mais de 190 países se reúnem anualmente para discutir caminhos para limitar o aquecimento global, mas a participação nas Conferências do Clima da ONU não se restringe à alta cúpula dos países, envolvem também sociedade civil e, claro, o setor privado.
Entre os temas que são debatidos durante as conferências do clima está, por exemplo, a necessidade de os países definirem novas contribuições nacionalmente determinadas, que são as metas de redução de emissões de gases de efeito estufa.
Para que seja possível diminuir essas emissões, os Governos fazem alinhamentos e tratados que, na prática, vão demandar mudanças também na iniciativa privada. Em muitos casos, as empresas vão precisar rever os seus processos produtivos e os seus modelos para possibilitar que essas reduções nas emissões sejam possíveis.
O diretor de sustentabilidade da Juntos Sustentabilidade, unidade de negócios do Grupo Approach especializada em ESG, Marcelo Vieira, considera que chegará um momento em que a preocupação com a sustentabilidade terá o mesmo peso que a preocupação com a qualidade para as empresas. “Hoje, nenhuma empresa consegue prosperar no mercado se ela não tiver padrões mínimos de qualidade. A mesma coisa se dá com a sustentabilidade”, acredita. “Os seus clientes, os seus investidores, até mesmo os seus fornecedores vão cobrar que você tenha um impacto menor sobre a natureza, sobre o clima, que você cumpra mais as regulações sociais e tenha também um cuidado maior com as pessoas, com a qualidade do produto, com os efeitos do seu produto sobre a saúde, sobre o meio ambiente. Então, fazer negócio sem ter esses mínimos padrões vai se tornar virtualmente impossível”.
Além de acompanhar as discussões sobre as mudanças do clima e a necessidade de se pensar em processos produtivos menos emissores, a iniciativa privada também pode encontrar nas conferências do clima uma janela de oportunidades para mostrar o que elas já vêm fazendo. Dentro da COP, o setor privado figura na chamada Green Zone, ou Zona Verde, espaço aberto à participação do público e que também reúne ONGs e a sociedade civil.
No espaço separado em estandes, muitas empresas apresentam suas iniciativas e também participam de discussões como, por exemplo, qual é o papel do setor privado na transição energética. E quando se trata de um país em que mais de 99% das empresas são micro e pequenas empresas, como é o caso do Brasil, naturalmente essas discussões também precisam passar pelos pequenos negócios.
“Os pequenos negócios no Brasil têm sido, sim, a grande mola propulsora para o crescimento do mercado econômico”, reforça o diretor superintendente do Sebrae no Pará, Rubens Magno. “Para se ter ideia, hoje, quem puxa a taxa de empregos na Região Norte são os pequenos negócios – e o Pará é muito forte dentro desse processo – e quando nós falarmos de desenvolvimento econômico, mas principalmente mudarmos o olhar que nós tínhamos no passado em relação ao meio ambiente, e ver que hoje é muito importante investir em ESG, entender sobre ODS, a gente está falando que, prioritariamente, a gente tem que trabalhar com as micro e pequenas empresas e com o setor produtivo”.