Irlaine Nóbrega/Diário do Pará – Catadores de materiais recicláveis desempenham um papel crucial na preservação ambiental e na redução do impacto dos resíduos sólidos urbanos. Em Belém, esses trabalhadores são responsáveis por grande parte da coleta seletiva na cidade, transformando toneladas de lixo em recursos reutilizáveis. Esses profissionais desempenham uma atividade fundamental na implementação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), podendo atuar na coleta seletiva, triagem, classificação e comercialização dos resíduos recicláveis, contribuindo para a cadeia produtiva da reciclagem.
Em 2004, trabalhadores autônomos da Terra Firme fundaram a Cooperativa de Reciclagem e Coleta Seletiva “Concaves” com o objetivo de incentivar a coleta seletiva nos bairros de Belém. Inicialmente com apenas seis voluntários, a iniciativa foi uma maneira de juntar os catadores pelo reconhecimento dos seus direitos, além de estimular a reciclagem dos resíduos sólidos urbanos, que são gerados nas residências e representam o maior número dos materiais destinados a lixões a céu aberto.
Legalizada um ano após o início das atividades, a cooperativa é a responsável pela coleta seletiva porta a porta do bairro de Nazaré, além do Umarizal, Reduto, Batista Campos, Pedreira, Cremação e Terra Firme. Plástico, papel, vidro, papelão e metal são comercializados, em média, 60 toneladas por mês para as indústrias responsáveis pela destinação e transformação de resíduos sólidos em novos bens de consumo. Em um processo totalmente manual, os cooperados iniciam a rotina fazendo uma triagem específica da coleta dependendo do tipo, cor e característica desse produto.
“Esses materiais chegam em big bags. Nós já criamos a nossa própria dinâmica, então fazemos uma pré-separação desses resíduos ainda no nosso roteiro de coleta. O que é papelão já vem separado do que é plástico, do que é vidro, e assim vai. Dentro dessa primeira separação, a gente faz uma mais específica para separar os sete tipos de plástico ou os três tipos de papel. Por exemplo, separamos a PET branca, colorida, a embalagem longa vida e o plástico duro porque cada um material tem um valor diferente para a industria”, revela a cooperadora Adriana Fonseca.
Ainda segundo a cooperadora, a coleta seletiva é um dos pilares da sustentabilidade urbana, já que reduz a quantidade de lixo enviada para aterros sanitários e diminui os impactos ambientais. A separação adequada de resíduos ainda contribui para a geração de empregos no setor de reciclagem, promovendo a inclusão social e a economia circular. Ao reciclar materiais como plástico, vidro, papel e metal, é possível reduzir as emissões de gases do efeito estufa, tornando as cidades mais limpas.
“Aqui nós temos pessoas com formação em nível superior até pessoas semianalfabetas. Então, a cooperativa é muito importante na questão da geração de renda e para a cidade a questão da economia com recursos. A gente sabe que não é barato para depositar o resíduo no Aterro Sanitário, é um recurso que pode ser economizado e investido em outros setores dentro da nossa própria cidade. Então todos ganham, o meio ambiente e os cidadãos com o trabalho da reciclagem”, afirmou Adriana.
ICOARACI
Criada há 15 anos, a Cooperativa de Catadores de Materiais Recicláveis Visão Pioneira de Icoaraci (Cocavip) é responsável por toda cadeia produtiva dos recicláveis, desde a coleta, separação, transporte, tratamento e transformação em matéria-prima. Com roteiro por todos os bairros de Belém, a iniciativa é principal eixo na geração de renda de 30 famílias envolvidas na iniciativa, através da comercialização para as indústrias paraenses, que destinam os materiais a outros estados do Brasil.
Em contrapartida, os demais materiais sem saída econômica, como algumas embalagens plásticas, são utilizados na produção de seixo e tijolos na fábrica da Cocavip, em um processo de verticalização dessas matérias-primas, que são utilizadas de forma ecológica na construção civil.
Para Nádia Luz, presidente e fundadora da cooperativa, as 19 toneladas diárias de matéria reciclável são um pequeno passo rumo à preservação do meio ambiente. “Estamos cuidando de nós mesmo porque nosso trabalho também é uma fonte de renda, assim como o ofício de um professor, de um médico. Isso contribui para um ar mais limpo, uma terra mais saudável e para o mar, de onde vêm alimentos que a gente come no nosso dia a dia. Quando esse material chega aqui, nós já temos várias pessoas para fazer a separação toda manual e outras para encher o caminhão que vai transportar o material para as indústrias”, explica Nádia.
ECOECONOMIA
O catador Jonas de Jesus, de 56 anos, é um dos fundadores da Cooperativa Concaves, local em que trabalha desde o início das atividades. Ele relata que, inicialmente, eram apenas seis cooperados coletando os materiais descartados pelos moradores da Terra Firme desde as primeiras horas da manhã. Nessa época, o trabalho ainda era bastante discriminado, já que o conhecimento sobre coleta seletiva ainda era escasso.
Hoje com 22 cooperados, sendo 17 ativos, a Cooperativa Concaves é responsável pelo estímulo à economia circular dos resíduos sólidos, necessidade que cresce a cada ano. “O nosso trabalho começa fazendo a coleta seletiva, ou seja, pegando o material reciclável. Hoje tem muita gente que faz coleta voluntária e solicita o nosso trabalho. Como esse material vem diretamente da casa dos cidadãos, sempre chegam bem limpinhos, diferente daqueles que fazem a coleta em lixões. Quando chega aqui, a gente faz uma triagem e a separação mais específica, separando pelos tipos de papel, tipos de plástico e vidro”, conta o catador.
Em um trabalho contínuo em prol do reconhecimento do ofício de catador de material reciclável, Jonas afirma que o trabalho exerce um papel fundamental para a preservação do meio ambiente e na geração de renda, principalmente para famílias em situação de vulnerabilidade, parte da chamada “ecoeconomia”, que prega o uso racional dos recursos naturais e a sustentabilidade.
“Hoje, com a COP-30 vindo para Belém, vemos a importância que o nosso trabalho tem, principalmente sendo reconhecido pela população e pela prefeitura. A gente limpa as ruas há anos e nunca tivemos reconhecimento. Se tivesse uma cooperativa em cada bairro, isso seria uma economia tremenda. Se esse material vem para cá ao invés de um lixão, ele será reaproveitado, economizando a natureza, limpando a cidade e gerando emprego e renda”, diz Jonas de Jesus.
Com uma rotina que inicia às 7h, o catador da Cocavip, Gilberto Craveiro, de 30 anos, percorre as ruas do centro e das periferias de Belém para coletar os resíduos sólidos urbanos gerados pela população da capital paraense. O trabalho é a principal fonte de renda e o que garante o sustento mensal da família dele. Para ele, além da importância financeira, o ofício proporciona o bem-estar dos moradores através da reutilização de materiais nocivos ao meio ambiente.
“Nós vamos buscar o material no centro de Belém para trazer para a Cocavip para triagem. Nós passamos o dia todo na rota pelos bairros e já chega no final da tarde na cooperativa, deixamos o caminhão e no outro dia já saímos para entregar para a revenda. Esse é um trabalho muito importante para a questão ambiental, para manter tudo limpo. E tem a questão financeira, assim, aqui é a minha principal fonte de renda, já é um dinheiro certo para manter minha família, além de ajudar a preservar o meio ambiente e deixar a cidade um pouco mais limpa”, concluiu Gilberto.