Eventos naturais em uma parte do planeta podem ter efeitos em outras regiões

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Trayce Melo/Diário do Pará – Nos últimos anos, temos enfrentado uma variedade de eventos climáticos extremos, como ondas de calor, secas, ciclones tropicais e enchentes. Com as mudanças climáticas se tornando cada vez mais evidentes, esses fenômenos extremos estão afetando a vida das pessoas de diversas maneiras.

Adriano Marlisson, meteorologista e professor na Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra), além de atuar no Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais da UFPA, explica que eventos climáticos em uma região do mundo podem afetar outras áreas, devido a fenômenos como teleconexões e mudanças no clima global.

“Eventos em uma parte do planeta podem ter efeitos diretos ou indiretos em outras regiões. Fenômenos naturais, como mudanças climáticas, terremotos e erupções vulcânicas podem gerar impactos em escala global. Além disso, ações humanas, como atividades industriais e desmatamento também podem provocar efeitos em grande parte do planeta”, pontua.

Ele menciona que um exemplo é o El Niño, que é um fenômeno climático natural, que se caracteriza pelo aquecimento anormal e persistente das águas superficiais do Oceano Pacífico na região tropical. Esse aquecimento altera a circulação atmosférica, afetando os padrões de chuva e temperatura em diversas regiões do mundo. “Em 2024, a influência do El Niño no Brasil resultou em secas no Nordeste e chuvas fortes no Sul, em alguns casos, enchentes, causando efeitos significativos em diferentes regiões”, destaca.

Outro exemplo citado pelo meteorologista foi o furacão Catarina, que se formou devido ao aquecimento do Atlântico Sul e atingiu a região Sul do Brasil em março de 2004, deixando 14 municípios em situação de emergência. Marlisson explicou que os furacões estão diretamente ligados à temperatura do mar, pois eles só se formam quando a temperatura da superfície do oceano está acima de 26°C. No caso do Catarina, a temperatura da água estava, de alguma forma, acima da média, o que contribuiu para a formação do fenômeno.

El Niño

Marlisson informa que estudos recentes mostram que o El Niño pode se apresentar de maneiras diferentes.

Ao analisar os eventos ocorridos entre 1893 e 2024, ele percebeu que os impactos variaram bastante. Por exemplo, em 1893, houve uma seca forte no Brasil, especialmente nas regiões Norte, Nordeste e Sudeste, que é considerado um dos primeiros registros do fenômeno e trouxe impactos significativos para a agricultura e o aumento das queimadas.

Já o El Niño de 1997-1998 foi um dos mais intensos já registrados, causando grandes impactos tanto no Brasil quanto em outros países. No Nordeste, essa seca foi muito severa, com uma queda acentuada nas chuvas, o que prejudicou a agricultura, o abastecimento de água e trouxe dificuldades para a população local.

Além da seca no nordeste, o fenômeno El Niño também trouxe chuvas excessivas para outras regiões, como o Sul do Brasil. Em 2005, durante episódios de estiagem intensa e prolongada, os níveis dos rios, como o Rio Negro, chegaram aos seus pontos mais baixos.

Nos anos de 2023 e 2024, o El Niño foi especialmente forte, contribuindo para o aumento do aquecimento global. Esses anos também quebraram recordes de temperatura média ao redor do mundo, sendo 2024 o ano mais quente desde que começaram os registros, há mais de 175 anos.

No contexto de Belém, o especialista diz que essas mudanças climáticas têm impactado principalmente a temperatura mínima. Ele comenta que, nos últimos anos, houve uma alteração significativa na zona de convergência, o que acabou influenciando a temperatura mínima do dia. Geralmente, na madrugada, a terra se resfria naturalmente, mas em anos de El Niño, essa temperatura costuma aumentar em cerca de 1 grau durante a madrugada.

“Sentimos que as noites estão mais abafadas e com vento quente, porque a terra não está conseguindo se resfriar como deveria durante a madrugada. Dessa forma, quando chega o dia, a temperatura já está mais elevada, pois o resfriamento não aconteceu como esperado”, explica.

Marlisson destaca que a preocupação com o El Niño e seu efeito na agricultura é bastante válida, principalmente porque cada vez mais a produção agrícola sofre interferências de condições climáticas extremas. Ele destaca que o El Niño pode causar tanto secas prolongadas quanto chuvas intensas em várias regiões, o que muda a disponibilidade de água e prejudica o crescimento das plantas.

”Por isso, é fundamental que a agricultura consiga se adaptar a esses desafios do clima para garantir que não falte comida e que a produção seja sustentável”, pondera.

O professor explica que as previsões atuais ainda não indicam a ocorrência de um fenômeno El Niño, como aconteceu nos últimos dois anos.

Ele comenta que, na maior parte do ano, o clima deve ficar em uma condição de neutralidade, ou seja, sem El Niño nem La Niña. “A expectativa era de que este ano fosse mais chuvoso, mas o mês de fevereiro nos surpreendeu com chuvas abaixo da média. Por outro lado, março e abril tiveram chuvas mais fortes. Para que possamos dizer que um El Niño está se formando, é preciso que o aquecimento das águas do Pacífico Equatorial dure pelo menos 90 dias consecutivos”, conclui o professor.

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