Ação humana pode ter levado à extinção de 1.500 espécies de aves

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A ação humana já pode ter levado à extinção ao menos 1.500 espécies de aves desde o fim da Era do Gelo —mais que o dobro do estimado até hoje. Por ora, as principais vítimas foram aves típicas de ilhas, mais vulneráveis a invasores, mas as chances de que o processo continue e se agrave em outros lugares do mundo são altas se a atual trajetória de degradação ambiental global for mantida.

A nova estimativa sobre as extinções do grupo foi feita por um grupo de cientistas coordenados por Rob Cooke, do Centro de Ecologia e Hidrologia do Reino Unido. Se a análise conduzida por ele e colegas de outras instituições europeias (entre eles o brasileiro Alexandre Antonelli, da Universidade de Gotemburgo, na Suécia) estiver correta, significará que 12% das espécies de aves do mundo já foram eliminadas por causa do Homo sapiens nesse período.

O cálculo, apresentado por Cooke e seus colegas no periódico especializado Nature Communications, envolve uma série de pressupostos. Além de usar os dados disponíveis sobre a onda mais recente de extinções de aves, convencionalmente datada a partir do ano de 1500 (marcando a expansão ultramarina europeia, os processos de intensificação econômica gerados por ela e, séculos mais tarde, a Revolução Industrial), a equipe também incluiu dados fósseis.

Isso significa que, além das extinções documentadas diretamente por naturalistas europeus, registradas por escrito do século 16 em diante, o grupo incluiu desaparecimentos de aves que podem ser inferidos pela análise de esqueletos e ovos antigos.

Tudo indica que esse processo começou já na fase inicial da expansão da nossa espécie pelo planeta, entre 100 mil anos e 70 mil anos atrás, saindo da África (o berço do Homo sapiens). No entanto, os dados fósseis sugerem fortemente que o estrago se intensificou bem mais tarde, a partir de 3.000 anos atrás, quando navegadores polinésios colonizaram primeiro o chamado Pacífico Ocidental (como os arquipélagos de Tonga e Fiji) e, vários séculos mais tarde, o Pacífico Oriental (que inclui o Havaí e a Nova Zelândia).

Todas essas regiões insulares combinavam uma série de fatores que as colocaram no topo dos “grupos de risco” para as extinções de aves. Por seu isolamento e distância dos continentes, elas tinham a tendência a ter faunas terrestres de vertebrados formadas, em larga medida, por esses animais. Já que mamíferos não voam (com exceção dos morcegos) e anfíbios quase nunca conseguem atravessar água salgada, apenas aves e répteis podiam chegar a tais ilhas.

Isso fez com que as aves ali se diversificassem muito, ocupando os nichos ecológicos (como o de grandes herbívoros, por exemplo) que caberiam a outros animais no continente. Ao mesmo tempo, o espaço relativamente reduzido das ilhas faz com que as populações dessas espécies nunca fossem muito grandes. E, por fim, o isolamento também as deixava particularmente vulneráveis a espécies invasoras, já que não tinham evoluído ao lado de muitos predadores e competidores.

Em resumo, as espécies de aves das ilhas do Pacífico eram muitas e frágeis. Quando os seres humanos chegaram, caçando-as ou trazendo consigo animais domésticos e pragas (como porcos e ratos, respectivamente) que podiam devorá-las ou comer seus ovos, o estrago foi rápido.

Assim desapareceram, por exemplo, diversas espécies de moas, aves não voadoras da Nova Zelândia que podem ter alcançado mais de 200 kg de peso, e diversas espécies de águias, pombos de grande porte, corvos, cacatuas e muitas outras aves. Um processo similar, embora em escala bem menor, também parece ter acontecido nas ilhas do oceano Índico, como Madagascar.

O pulo do gato da metodologia do trabalho foi considerar que, mesmo com base na análise dos fósseis e dos registros históricos, boa parte da diversidade desaparecida de aves não chegou até nós, já que os restos de muitas das espécies não teriam sido preservados. Usando dados sobre tamanho territorial, clima, nível de isolamento, tipo de vegetação e diversos outros fatores, os pesquisadores criaram um modelo matemático capaz de prever qual era a diversidade original dos arquipélagos mundo afora.

Com isso, eles estimaram que 55% das extinções do passado aconteceram sem deixar rastro. Apontaram ainda que o último grande pico de desaparecimentos teria acontecido por volta do ano 1300 d.C., momento no qual as taxas de extinções do grupo chegaram a ser 80 vezes superiores à considerada normal levando em conta o registro fóssil como um todo.

A onda de extinções atual tem, por ora, mais ou menos a metade da magnitude do pico anterior, e parece ter perdido um pouco a força a partir da segunda metade do século 20. O problema, porém, alertam os cientistas, é a existência da chamada “dívida de extinção” —grosso modo, o fato de que algumas espécies já se tornaram ou estão perto de se tornar inviáveis do ponto de vista reprodutivo no longo prazo.

Com isso, seu desaparecimento estaria praticamente assegurado —é como se fossem espécies-zumbis. Uma estimativa citada pelos autores do estudo sugere que a atual “dívida de extinção” já atinge cerca de 700 espécies de aves. Isso faria com que o atual surto de extinções esteja acontecendo num ritmo entre três e quatro vezes maior que o da pior onda do passado.

A única maneira de minimizar esse risco é investir em ações de conservação, em especial preservando os habitats das aves mais ameaçadas e coibindo a caça e a ação de espécies invasoras.

Com informações da Folhapress

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